O estabelecimento da guarda compartilhada não exime o alimentante de prestar alimentos: a afirmação realizada nessa frase é fundamental para que fique estabelecido a diferença entre os institutos da guarda e da pensão alimentícia, pois os dois conceitos não devem ser confundidos.
Os questionamentos sobre a matéria vieram à tona após a entrada em vigor da Lei nº 13.058/2014, que alterou os artigos do Código Civil referentes à guarda compartilhada.
Referida alteração legislativa teve como objetivo beneficiar a criança/adolescente, concedendo-lhe maior convivência, se possível, com ambos os genitores.
Para melhor entendimento do assunto, faz-se necessário trazer os conceitos da classificação da guarda: guarda jurídica e guarda material.
A guarda jurídica é a responsabilidade de educar os filhos e é elemento do poder familiar. São as tomadas de decisões que envolvem a educação, saúde, bem-estar e outros do filho menor.
A guarda material pode ser definida como o compartilhamento da mesma residência com a criança e o adolescente. Via de regra, é estabelecida judicialmente quando da dissolução da sociedade conjugal por parte dos pais. Pode ser caracterizada pelo convívio físico no mesmo ambiente, mantendo o filho sob sua vigilância, posse e companhia.
Na guarda compartilhada encontra-se presente tanto da guarda jurídica quanto a material, pois as decisões que envolvem os filhos deverão ser tomadas de forma conjunta pelos genitores, e, o tempo de convivência com a prole será estabelecido de forma proporcional, visando o equilíbrio de convivência do menor com os pais, de acordo com a necessidade do menor e a disponibilidade dos genitores.
Relevante pontuar que a divisão de tempo quanto à guarda material não será exatamente igualitária, metade do tempo ficando o menor em convívio com o pai e metade do tempo em convívio com a mãe.
Na grande maioria dos casos, a criança terá uma residência fixa, e este genitor exercerá a “prevalência” da guarda material, porém, serão estabelecidos dias e horários para que conviva com o pai/mãe com quem não mora habitualmente, buscando-se, assim, um convívio equilibrado e o fortalecimento da relação afetiva tanto com o pai, quanto com a mãe.
Dispõe a lei 13.058/14 sobre a Guarda Compartilhada:
“Na guarda compartilhada o tempo de custódia física dos filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos”.
Da leitura do dispositivo legal acima colacionado, é possível ratificar o disposto nas linhas anteriores, na medida em que o legislador afirma que, na guarda compartilhada, o compartilhamento deve se dar de forma equilibrada. A custódia dos filhos com ambos os genitores deve ser estabelecida de maneira razoável, equânime, sempre considerando as condições fáticas e o interesse dos filhos.
Ultrapassado o conceito da guarda compartilhada, passa-se ao enfrentamento das dúvidas em relação à pensão alimentícia na guarda compartilhada.
Nos casos em que estabelecida a guarda compartilhada, está o alimentante exonerado do dever de prestar alimentos?
Da leitura da Lei nº 13.058/14 não se enxerga em momento algum a previsão de desobrigação da pensão alimentícia nos casos de guarda compartilhada.
No entanto, é comum que o/a alimentante acredite que o fato de ter gastos com o filho na guarda compartilhada o exima de pagar pensão alimentícia, pois existe uma cultura enraizada no Brasil que considerar a pensão alimentícia com forma de punir o alimentante no processo de dissolução da sociedade conjugal, não entendendo o caráter alimentar e solidário dos alimentos.
Portanto, ainda que a guarda do menor seja estabelecida na modalidade “compartilhada”, onde usualmente um dos genitores coabite com o menor, possuindo a “prevalência” da guarda, e por consequência tenha maiores gastos com o filho em relação ao outro genitor, deve-se ter em mente que é obrigação de ambos cooperar para o mantimento do filho.
Dessa forma, levando em consideração a condição econômica dos genitores (possibilidade) e a necessidade do menor (necessidade), o juiz poderá estabelecer que um dos detentores da guarda pague pensão alimentícia em favor do filho, visando sempre a manutenção do equilíbrio e o compartilhamento das obrigações entre os pais, de forma proporcional.
A proporcionalidade é instituto jurídico extremamente relevante e utilizado na prática forense. Não é justo determinar que ambos os genitores contribuam exatamente igual, haja vista que, provavelmente, têm rendimentos distintos e possibilidades distintas. Por este motivo, a divisão das despesas não é exatamente de 50% para cada um dos pais, ela será definida pelo juiz de acordo com as possibilidades financeiras de cada parte, sempre levando em consideração o melhor interesse da criança/adolescente.
Portanto, quando a guarda for compartilhada e o filho efetivamente morar com apenas um dos pais, o que é o mais comum, este com quem o filho mora poderá buscar judicialmente a pensão alimentícia normalmente para auxiliar nas despesas da criança (assistência, criação e educação).
Na hipótese de uma guarda unilateral que venha a ser convertida para uma guarda compartilhada, o juiz analisará o caso concreto e poderá sim diminuir, ou aumentar, o valor antes pago pelo alimentante, pois ambos os genitores terão reciprocamente o compartilhamento de seus gastos em relação ao filho. Contudo, é importante ter em mente que a guarda compartilhada não implica obrigatoriamente na exoneração ou redução da pensão alimentícia.[1]
A guarda, a pensão alimentícia, e demais institutos que tratam do interesse do menor serão analisados caso a caso, portanto é de suma importância não criar paradigmas e dogmas sobre tais assuntos.
Então, conclui-se que a guarda compartilhada não resulta no fim da obrigação alimentar e no dever de sustento.
Autor
Raul Guilherme Malacarne Dutra
Elaborado em 08/2019
Advogado especialista em Direito Civil.
[1] https://jus.com.br/artigos/63314/pensao-alimenticia-na-guarda-compartilhada
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